terça-feira, 19 de junho de 2018


Nossas Capelas – Um pouco de História
Nos primórdios da Colônia do Paracatu, o pessoal que aqui chegou ficou disperso pelas diversas regiões, muitas vezes até isolados. A assistência religiosa era precária. O Vigário de João Pinheiro celebrava na sede (hoje Brasilândia), o administrador mandava o caminhão para levar as pessoas para a missa e batizados. Mais tarde Frei Dionísio começou a celebrar no Riachinho do Gado Bravo. As primeiras missas eram celebradas na residência do colono Jorginho Araújo. Posteriormente, em 1954, a comunidade se organizou e foi construída a capela no lote da escola. Foi a primeira capela construída em toda a Colônia (*). Foi colocada sob a proteção de Santo Alberto de Sicília, santo da Ordem Carmelitana. Por se tratar de um santo da Ordem, Frei Dionísio escolheu o santo por ser protetor contra as febres, a região era insalubre, dava muita malária. Fundou-se a Conferência de Nossa Senhora do Carmo. Além da missa todos os meses, havia a celebração da dominga, com leilões. Celebrava-se um culto, terço e outra devoções. As missas eram celebradas no adro, pois era tal o acúmulo de fiéis que não cabia na capelinha. Carros de boi chegavam do Boqueirão, Sapato, Forquilha, Buriti do Barro, Peri Peri, Poções, Novilha Brava e outros lugares. Famílias se deslocavam com cozinha, camas, etc. para participar da missa, batizar os filhos e os casamentos. Os noivos se aprontavam no barraco ao lado, as noivas, pois os noivos iam ao cerrado e se trocavam; bandos de seriemas faziam a maior algazarra e tudo acontecia de forma tão descontraída. Até o almoço era preparado e servido debaixo das árvores. Em setembro celebrava-se a festa de Santo Alberto e São Vicente. Belos tempos.
(*) primeira capela construída na Colônia. Havia grande afluência de fiéis pois não havia outra. Posteriormente, a Colônia construiu a capela de Nossa Senhora Aparecida, ampliada e desfigurada, pois era bastante moderna a construção original.

Dom Bosco
Na década de 60, começaram a surgir as novas comunidades. Na Forquilha do Espinho, hoje Dom Bosco, em 1962 Frei Adolfo Brito Pessoa iniciou a formação da comunidade. No entorno as “reservas” tinham muitos moradores o que impulsionou muito o desenvolvimento do lugar.A família de Dorinato deixaram o Riachinho e muito ajudou na nova comunidade. O nome de Vila Dom Bosco foi dado por Doutor Miguel Tozzi, administrador da Colônia. São João Bosco foi também dado como padroeiro. Ex-aluno salesiano Doutor Miguel, natural de Juiz de Fora, segundo relatou-me em recente visita que tive a honra de recebê-lo, que cursou o Colégio Salesiano em São João Del Rey. Por isso a sua ligação com nosso padroeiro. Conversando com Dona Maura ela falou-me da resistência em aceitar o padroeiro, pois a escolha da Comunidade foi Nossa Senhora Aparecida.
No ano de 2019, o Padre da Paróquia resolveu construir nova igreja matriz, tendo em vista que a atual já era pequena para comportar os fiéis. Após realização de intensa campanha para angariar fundos, ocorreu um impasse . A administração municipal, talvez por falta de diálogo entre as partes delibera fazer o tombamento da igreja como patrimônio histórico. O Padre por sua vez reúne o Conselho da Paróquia e decidem demolir a igreja; o tombamento tornaria o bem intocável. No dia 26 de outubro de 2019, pelas 10h uma retroescavadeira se posicionou e iniciou os trabalhos de demolição. A Comunidade dividida entre os partidários da construção da nova igreja foram surpreendidos pelos protestos liderados pela prefeita. Segundo as reportagens divulgadas pelos mais destacados órgãos de comunicação, os conflitos geraram o apedrejamento do Padre, inclusive da recém construída casa paroquial. Foi um lamentável incidente que marcará para sempre a História da pacata cidade tranquila e ordeira. Oxalá os próximos capítulos não registrem nada tão desagradável.  
(Detalhes sobre a História de Dom Bosco consultar os registros da Professora Sueli Gomes da Silva).

Córrego da Ponte
A capela do Córrego da Ponte foi construída em 1963. Sob a liderança do Senhores José Manoel da Costa, Edir Rabelo, Antônio Dias, Leopoldo e Antoninho Pires,do Porto. Com a anuência de Frei Humberto deu-se início a campanha pró construção. No dia 15 de agosto de 1963 passei no local para conhecer e conversar com uns amigos que trabalhavam na obra. Tratava-se de uma pequena capela. Moradores do Porto dos Poções (*), Limoeiro, Extrema passaram a fazer parte da Comunidade da Igrejinha, nome que passou a ser conhecida. Originalmente o nome é Córrego Ponte. O Senhor José Manoel doou uma determinada porção de terra para a construção. Em 1965 teve início a construção do prédio da Escola Estadual São Sebastião, hoje desativada, ao lado da Igreja. No início da década de 70(*) bonita procissão saindo da residência do Senhor Jésus Manoel trazendo as imagens deSão José e Nossa Senhora Aparecida para a capela onde aconteceu a respectiva entronização.  Também nessa época começaram os festejos do encerramento do mês de Maria; houve tempos em que era uma festa muito animada.Aquele tempo a estrada que partia de Brasilândia no alto do Gado Bravo bifurcava indo para a Forquilha do Espinho, sendo que a outra tomava a direção do Porto dos Poções com destino a Paracatu. Poucos lembram ainda do Porto dos Poções, reconhecido nos guias de navegação do início do século passado. Havia muitos moradores nas redondezas nas lavouras ou mesmo nas carvoarias, hoje o número de moradores caiu bastante. Comunidade acolhedora, destaca-se pelas grandes propriedades e o chão vermelho, característico do cerrado.
(*) Porto dos Poções no rio Preto. Mencionados nos guias de navegação do início do século passado quando havia navegação. Uma balsa atravessava carros com destino a Paracatu. Muito antes era a ligação de Paracatu com a região urucuiana no tempo do carro de boi e tropas.
 (*) A entronização pode ter acontecido ainda na década de 60.


Novilha Brava
A região da Novilha Brava abrangia o Baixo Gado Bravo, Cascalho e Suçuarana. Àquele tempo tudo girava em torno da casa da Novilha, antiga sede de fazenda que pertenceu à Dona Joaquina do Pompeu. Com o advento da Colônia, tornou-se sede do lote, que foi adquirido pelo Senhor Irineu de Paiva (*) em novembro de 1958. Desde 1960 passou funcionar nesta a Escola Rural, recebia alunos de toda a redondeza. Em março de 1963, mais precisamente no dia 13, Frei Humberto celebrou a primeira missa. No mesmo ano foi feito o loteamento do remanescente da reserva, tendo o topógrafo da Colônia, Senhor Espedito Sebastião Ferreira reservado o lote da capela e da escola. Coube também ao mesmo escolher o padroeiro e o nome do povoado: Vila Santo Antônio.(*) As celebrações continuaram na casa da Novilha até abril de 1965, desde então a partir de 13 de junho, com a celebração da festa de Santo Antônio, passou-se a celebrar na Vila. A celebração da primeira festa foi precedida da Trezena ocasião em que já angariava fundos para a construção da capela. Na véspera foi rezado terço e aconteceu o levantamento do mastro. O povo foi até a vargem próxima, apanharam o mastro e a bandeira e se dirigiram ao adro, numa grande manifestação folclórica e religiosa, cantorias, instrumentos, a música “Ó que santo é este que vamos levar, é o Senhor Santo Antônio para festejar” marcou. Ao chegar ao local da futura capela, iluminado pela fogueira, foi erguido o mastro sob o espocar de fogos de artifício. Um sistema de iluminação original foi usado, estacas de vinhático fincadas nas imediações iluminavam todo o local. A simplicidade, a originalidade e a alegria, fez com que nunca mais aconteceu um levantamento do mastro tão marcante.
(*) Irineu de Paiva, meu pai, adquiriu em 20/11/1958 o lote da Novilha. Procedente da região do rio Doce passou nele residir com sua família a partir de 09/02/59.
(*) Tia Lucinda havia pedido ao meu pai que construísse um capela dedicada a São Pio X. Doou para a nova capela uma toalha de altar de linho com rendas confeccionadas por ela a bordo do transatlântico "Frederico C" em suas peregrinações à Europa.

A Vila Santo Antônio parecia um sonho.
A população da nova Vila era constituída de pobres roceiros. Chegaram quase sem nada, ganharam um pedaço de terra para cultivar, como se tratava de terrenos sujeitos à enchente, a administração loteou o remanescente, aliás que era um pouco mais alto para fazerem as casas. Foram surgindo casebres cobertos de palha de buriti. O projeto da construção da capela, conforme o topógrafo Espedito havia pedido, estava parado. Um fato novo foi providencial para que a capela surgisse. Naquele tempo as paróquias ocupavam uma extensão enorme. Um sacerdote atendia na medida do possível uma grande população. O Bispo de Paracatu, Dom Raimundo Lui achou por bem criar de forma verbal a paróquia de Brasilândia. Ela ocuparia parte do município de João Pinheiro e foi confiada a Frei Basílio, também carmelita. A paróquia de Bonfinópolis a cargo de Frei Humberto, se restringiu aos limites do município. A comunidade do Riachinho era constituída em grande parte por moradores da banda de cá do Gado Bravo, por isso o padre para acomodar os fiéis na sua respectiva paróquia, interessou-se pela criação da comunidade, apoiando a construção da capela prometendo dar toda assistência necessária. Diga-se de passagem, ele cumpriu rigorosamente o prometido por mais de trinta anos. Tratava carinhosamente a Novia Braba uma das comunidades de sua predileção (*). Aquele tempo, em 1965, o padre andava a cavalo pela vastidão de sua paróquia.
(*) Sobre Frei Humberto e fatos relacionados a ele escrevi “O Semeador de Comunidades”.


A História continua...
As distâncias eram enormes. O padre tinha os pousos onde pernoitava, atendia o povo nas confissões e celebrava a missa e após administrava o batismo. Por longos anos lá em casa hospedava o padre. Até o Bispo quando havia necessidade cumpria os compromissos do pároco. Depois de conhecer o local da futura capela, onde em 1964 percorri com ele em meio a capoeira de mororó, em abril de 1965 autorizou a campanha para a construção. Autorizou ainda a reza do Mês de Maria e ato contínuo o início da Trezena de Santo Antônio, cuja festa realizou-se no dia treze. Os moradores se reuniram em mutirão e desbravaram o matagal, encarregando inclusive João Evangelista Peres para ser o Tesoureiro. Levantou-se um barraco de palha para servir de capela provisória. Conforme pedido do padre foi fundada em 27/05/65 a Conferência de São José; seu arquivo registra um pouco como era a situação dos moradores e a carência naquela época. Posteriormente, em 04/03/74 teve sua Carta de Agregação outorgada pelo Conselho Geral da SSVP em Paris. O Centro do Apostolado da Oração foi fundado em 06/06/65, o mesmo funcionou até pelos anos noventa. Foi doada uma pequena imagem de Santo Antônio por Helvécio Mendes Paiva; a mesma era colocada no altar improvisado e depois guardada no balaio que continha os enfeites de papel de seda. Até hoje não sabemos que fim levou a imagem. Foram feitos tijolos e no ano seguinte iniciou-se a construção. A capela primitiva era pequena, sendo acrescentada a parte de frente e também o fundo. Impressionante notar que ao ser celebrada a primeira missa, que sempre digo, foi o seu batismo e digo mais sem falsa modéstia, acolitei esse batismo, a Vila deslanchou. As vezes vemos que todas as cidades tiveram o seu início em torno de um cruzeiro, uma capelinha e a presença do sacerdote celebrando a primeira missa; aqui não foi diferente. A Administração da Colônia iniciou em 18 de agosto de 1965 a construção do prédio da Escola Santo Antônio; constava de duas salas de aula e uma secretaria. A primeira construção mais importante seguida da capela. Devagar começaram a surgir as primeiras casas de tijolos cobertas de telhas. O Frei Humberto entregou a comunidade aos cuidados dos leigos, pois ele afinal dado a extensão da paróquia não poderia vir com mais frequência, só mesmo para a missa mensal. Em todas comunidades leigos cuidavam das celebrações, dos leilões, etc. Quando o padre retornava deixava as orientações, folhetos e material das campanhas. As novenas de Natal e a Campanha da Fraternidade sempre tiveram destaque nas celebrações. O Concílio Vaticano II cujo encerramento se deu no final de 1965, trouxe muita inovação. A reforma litúrgica, a participação dos leigos, as celebrações na língua vernácula e não mais em latim. As partes da missa devagar foram rezadas em português. Tudo facilitou para a participação dos leigos. Interessante o que mais deixou o povo perplexo não foram as mudanças na liturgia, que foram assimiladas com muita facilidade, mas a reforma do calendário. Acostumados com os dias santos de tradição, diziam que o padre se tornou “crente”, aqui no sertão além de uma infinidade de dia santo, guardavam a “primeira segunda-feira de agosto”; até hoje não sei afinal o sentido do dia. Precisamos considerar o contexto, pois aquela época todos trabalhavam na roça, não empregados como hoje, além de não sofrer as influências dos meios de comunicação, o ambiente facilitava o cultivo das tradições. Outro aspecto a considerar é que a região tinha sua população formada por pessoas oriundas de muitos municípios com costumes diferentes, por ter passado por um processo de colonização. As festas de Santo Antônio eram celebradas com muita modéstia. A reza do terço, uma mesada de café com quitandas na casa do festeiro, após caminhavam até o adro e levantavam o mastro. Houve um ano, em 1971, deu uma chuva e o mastro caiu ao chão. A missa sempre celebrada no próprio dia do santo, conforme o padre prometeu quando da fundação da comunidade. Na trezena de 1969 houve muita animação devido à farta colheita. Sua renda na época possibilitou a aquisição do sino. Foi encomendado à Fundição Crespi de São Paulo, afamada na confecção de sinos. No primeiro Domingo do Advento soou pela primeira vez. Para surpresa da comunidade, o bispo Dom Raimundo Lui veio celebrar, tendo pernoitado em minha casa. Um fato pitoresco, descendo até à Vila, por ser um domingo pensou em celebrar a missa, mas tão logo acendia as velas e lamparinas uma nuvem de cupins alados tomava conta de tudo. Não houve solução, a missa ficou para o dia seguinte. De uma simplicidade extrema Dom Raimundo veio cumprir o calendário de missas, Frei Humberto estava hospitalizado em São Paulo. Nessa visita os esteios do sino estavam lavrados e serviram de bancos para o pessoal e o bispo no adro. Aquele tempo os roceiros vinham para a missa trazendo a enxada e roupa para trocar, terminada a missa, vestiam os trajes de roça e trabalhavam o restante do dia, com as bênçãos de Deus, é claro. Ninguém nunca reclamou que sua roça ficou no mato por ter participado da missa. A comunidade foi caminhando sempre assistida e orientada pelo padre. A celebração do culto dominical teve início em julho de 1974. No início havia um livro do culto, das Paulinas, só depois começaram a editar o folheto próprio da celebração da Palavra.A capela primitiva media apenas nove metros de comprimento, muito pequena. Foi ampliada acrescentando a parte de frente. No mesmo ano em julho de 75, aconteceu um encontro muito importante em Bonfinópolis. Diversas diretrizes da CNBB relacionadas às CEBS foram implementadas. No ano seguinte em Paracatu teve o grande encontro em nível diocesano. Todas paróquias foram representadas por numerosas delegações. No Natal de 1976 teve início a celebração da Novena de Natal. A novena com a participação das famílias sempre encerra com a Ceia de Natal conforme o tradicional costume. Momento de congraçamento e partilha. O Documento de Puebla foi amplamente estudado nos encontros realizados em Unaí. As paróquias de Bonfinópolis e Unaí por sinal muito extensas aquela época mandavam os representantes das comunidades. Aquele tempo não havia ainda desmembrado novos municípios e criado novas paróquias. Geograficamente uma enorme área era representada. Além dos estudos bíblicos ministrados por Frei Carlos Mester, o documento de Puebla teve seu estudo dirigido de forma didática por uma equipe de religiosas.

Geraldo M Paiva Junho/2018