terça-feira, 23 de janeiro de 2018

HISTÓRIAS DA COLÔNIA

HISTÓRIA DA COLÔNIA

HISTÓRIA DA COLÔNIA DE BRASILÂNDIA
Região da Novilha Brava

A história da Colônia do Paracatu está pontilhada de lutas, trabalhos e heroísmos; muito trabalho teve os funcionários que aqui se aportaram para a implantação da nova colônia, imaginamos a audácia e coragem daquelas famílias que enfrentando toda sorte de adversidades embrenharam-se por aqueles cerrados e matas para fixarem num lote, que muitas vezes existiam apenas nos mapas...
Sabe-se que as terras ocupadas pela Colônia pertenceram outrora à Dona Joaquina do Pompéu, tendo obtido a sesmaria como presente de Dom João VI em nome de sua mãe, Dona Maria I, rainha de Portugal, em agradecimento à grande quantidade de mantimentos enviados através de carros de bois e tropas para o Rio de Janeiro, quando sua comitiva chegou à corte, temendo uma invasão de Napoleão Bonaparte a Portugal. A sesmaria que ocupava quase toda a região da margem esquerda do rio São Francisco, foi divida por Dona Joaquina entre seus filhos, sendo que esta região ficou para seu filho Inácio, cujo nome herdara do próprio pai. Este casou-se e uma de suas filhas desposou o ouvidor paracatuense Coronel Rodolfo Garcia Adjuto, ficando como herdeira de uma longa faixa de terra ao longo dos Rios Preto e Paracatu. Deixando a Ouvidoria, o marido resolveu explorar, ainda jovem, as terras herdadas pela esposa. A fazenda com uma imensa área era chamada de Novilha Brava, sendo dividida em retiros. No ano de 1908, o Coronel Rodolfo vendeu estas terras para os ingleses e estes fundaram aqui uma empresa intitulada “Brazil Land Companhy”. Com a morte dos antigos sócios proprietários, a fazenda foi abandonada ficando à mercê da própria sorte. No ano de 1945, o presidente Getúlio Vargas desapropriou a fazenda e em 1952 foi instalada a Colônia Agropecuária do Paracatu. (1)
De um modo geral no território ocupado pela Colônia quase nada existia construído, exceto os retiros, geralmente localizados nas antigas sedes de fazendas de criação de gado. Naquele tempo a via fluvial era o principal meio de penetração, dada a inexistência de estradas e os meios de transporte hoje existentes; um pequeno vapor, o “Paracatuzinho” fazia escala no Porto Extrema, hoje bairro do Porto em Brasilândia; a casa sede, até hoje existente, localizada ao pé da serra com uma vista magnífica sobre toda a planície do rio Paracatu; naquela época, segundo testemunho de pessoas que lá se hospedou, existia relativo conforto.
Dentre os retiros espalhados pela região destacavam: Barra, Forquilha do Espinho, Boqueirão, Limoeiro, Peri-Peri e Novilha Brava; este último, embora tenha sido a sede da fazenda, deixou de ser a sede, pois a Extrema, por ser localizada junto ao Paracatu e seu porto,escoava com mais facilidade a produção local. Os rebanhos eram numerosos, sabe-se que o gado era criado com pouco trato e custeio, muitas vezes, manadas empastavam ás margens das veredas tornando-se selvagens, exigindo grande perícia dos valentes vaqueiros para levá-las ao curral juntamente com as crias novas nascidas nos logradouros que nunca tinham visto gente. Esses rebanhos, mais tarde foram deixados totalmente sem custeio, tornando-se os chamados “brabesas”. Merece ser descrita à parte a façanha dos vaqueiros; viviam poucos em cada retiro, humildes, tímidos, mas ao mesmo tempo destemidos e valentes não temendo os bravíssimos bois mucambeiros que se entrincheiravam nas empucas; resistiam até as últimas, quando os vaqueiros partiam pela manhã com a missão de trazer algum boi desse tipo preparavam como se fosse para uma grande batalha. Os cavalos treinados para a pega dos bois, distorciam com rapidez e elegância dos troncos e galhos, quando largavam as rédeas, não havia o que segurasse, a rês era laçada e chinchada ao cavalo, só descansavam quando o bicho estava dentro do curral. Segundo relato de antigo vaqueiro, quando todas as tentativas de amarrar o touro não davam resultado e o bicho dava a testa, temendo serem atingidos no meio do matagal, só restava uma alternativa: uma saraivada de balas dava fim ao valente animal, que ficava á mercê dos urubus. Até hoje, encontra-se ferragem de arreios, pedaços de cruzes de aroeira, que segundo o mesmo vaqueiro, marca o lugar de algum “acidente”. A alimentação era constituída quase exclusivamente de carne e derivados, seu modo de vida se desenvolvia à margem da civilização, sua religião constituía muitas vezes a uma visita à cidade de Paracatu para batizar um filho ou para o casamento, que, aliás, segundo dizem, não importava muito, pois tinham a sua própria moral, casamento no padre ou feito por cá mesmo fazia pouca diferença e era encarado com muita naturalidade. Não é de estranhar que segundo relato da Igreja, naquela época, “dada a pouca formação, ser difícil a vida religiosa naqueles sertões”.
Embora desconfiados e tímidos, não perdiam oportunidade de fazer gozação dos patrões ingleses; contou-me um antigo vaqueiro que de comum acordo com os colegas, pregaram uma peça num inspetor inglês que fazia vistoria nos retiros. Ao chegar à Novilha Brava, saíram de manhã pelos pastos, ao chegarem do outro lado do açude velho, chamaram a atenção do fiscal para rastros no cascalho fininho, eram de um animal estranho, o chamado “pé de garrafa” dada à semelhança do rastro com o fundo de uma garrafa; o inglês ao verificar o rastro pediu para retornarem para casa; não gostaria de encontrar o temível bicho. À noite, no sossego do rancho, foram rir da armação que fizeram; um vaqueiro simplesmente havia feito os rastros com o fundo de uma garrafa; propositalmente passaram por lá com o inglês, que engoliu esta na maior credulidade. Essa brincadeira foi narrada pelo vaqueiro Emídio Nogueira que morou por muitos anos na Novilha Brava. Contou ainda outro caso bastante interessante. Mostrando em um portal uma pequena cruz cravada a canivete, contou que numa sexta-feira santa, um vaqueiro pediu que sua mulher matasse um frango e preparasse, apesar do dia ser de tão grande respeito. A mulher, submissa, apesar de muito a contragosto, tratou de preparar o frango. Quando tudo pronto, o marido sentou-se no degrau que desce para a cozinha, após servir o prato com o apetitoso frango, preparando para iniciar o almoço, fixou o olhar para debaixo da laranjeira e ficou estático, não falando nada com ninguém, entregou o prato à sua mulher e tomando o canivete, traçou no portal aquela tosca cruzinha; naquele dia não comeu nada, não disse sequer uma palavra; a esposa julgou que o mesmo teria tido uma visão. Afinal estava preste a cometer um grave sacrilégio, comer carne em plena Sexta-feira Santa.
Quase todo lugar, tem seu nome ligado a um fato ou pessoa; córrego do Banguelo, Pedro Gomes, Capão do Sargento, Gado Bravo, Sussuarana, Muquém, Atoleiro; dizem que esse córrego ganhou o nome devido a uma senhora muito gorda que possuía propriedades por essa região, quando passava por lá, impreterivelmente o cavalo atolava, devido ao peso da cavaleira. Muitas histórias engraçadas; aquele grupo de vaqueiros, saindo para o campo, encontrando uma anta, jogam-lhe o laço e sem a mínima cerimônia, trazem-na até o curral. O nome de Novilha Brava, conta-se a lenda que é devido existir na região uma novilha bravíssima; os vaqueiros tentavam traze-la até o curral, mas era tempo perdido. Corria feito pensamento; pois, segundo contam, ela possuía três pés, sendo impossível alcançá-la na corrida.

NOTAS
(1) Aroldo Dayrel, jornalista.

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