A IGREJA DA NOVILHA BRAVA
A Igreja na Novilha Brava
Com a decadência do ouro nos fins do século XVIII, a economia da região de Paracatu sofreu grande transformação. Novas alternativas econômicas foram surgindo em virtude da exaustão dos aluviões. Com as existências de vastas pastagens nativas, iniciou-se o estabelecimento de criatórios extensivos de gado, principalmente nos vales dos grandes rios. Descendentes das tradicionais famílias de Minas foram adentrando pelo sertão implantando as fazendas de criação.
A fazenda da Novilha Brava dentre outras com vasta extensão de terras situadas às margens do rio Preto, entrecortada pela primitiva estrada de Paracatu ao São Francisco, tornou-se um ponto estratégico em toda a região. Com seus varjões imensos, capões e vazantes, comportava, segundo narrativa de antigos vaqueiros, até cinco mil bois. Sua existência já é comprovada nas primeiras décadas do século XIX quando consta da relação dos latifúndios da famosa matrona mineira Dona Joaquina do Pompéu. Pelos vestígios existentes demonstra que na época já era bastante desenvolvida. Além da criação extensiva de gado, possuía engenho de cana-de-açúcar, açudes, fabricação de telhas e ladrilhos em olaria nas barrancas do córrego Pedro Gomes. Em frente à casa sede enorme cruzeiro de aroeira com sepulturas em torno, do mesmo até hoje existe o que restou: uma pequena cruz; pela durabilidade da aroeira pressupõe-se que seja muito antigo e pode ter sido o marco inicial da fé nessas plagas. Pela distância de Paracatu dá para supor como viviam os habitantes àquele tempo. A carência do suporte básico da existência humana, a falta de assistência religiosa, médica e educacional. O homem vivia em pleno sertão; suas tardes eram acalentadas pelo canto da jaó e seu despertar com a algazarra estridente das maritacas e periquitos.
Como poderia casar-se, batizar os filhos e praticar os atos elementares da religião em região tão inóspita e carente de tudo? Talvez uma vez ao ano, no período das secas fossem até Paracatu nos festejos de São Benedito. Segregados da civilização, talvez trouxessem em si o germe da fé; o contato direto com a natureza, o ambiente místico do sertão o predispunha a isso. Uma história contada por um antigo vaqueiro talvez ilustra bem como o povo vivia sua fé. Certo dia, conta seu Emídio, numa sexta-feira da Paixão, um peão um tanto abrutalhado, pega um frango bem grande e gordo, mata-o e entrega para esposa prepará-lo. A pobre mulher estupefata, acostumada a obedecer sempre, se dispõe a contragosto a cozinhar a ave. Pronto o almoço, convida o marido a servir-se. Tomando o prato o rude vaqueiro encheu-o até as bordas; afinal o cardápio estava mesmo caprichado. Sentou-se no degrau da cozinha e já ia começar a saborear o delicioso prato quando de repente paralisa-se. Com o olhar fixo em determinado ponto debaixo das mangueiras, parece hipnotizado. Após alguns momentos de indecisão entrega o prato à mulher sem sequer tocá-lo; ajoelha-se diante do portal da despensa, toma o canivete e grava uma rústica cruz, diante da mulher que atônita a tudo assistia. Teria tido uma visão? Teria refletido, pensado o sacrilégio que ia cometer? Só Deus sabe. A mulher contou que o mesmo passou o resto do dia sem dizer sequer uma palavra. Conclui-se que mesmo no total abandono em que viviam, aquele povo já vivenciava a sua fé.
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