terça-feira, 23 de janeiro de 2018

O TREM TA FEIO

O TREM TÁ FEIO



O trem tá feio!

Dezembro de 1989. Chuvas diluvianas caiam sem cessar. Um fenômeno característico das grandes enchentes: bandos de sapinhos pelas estradas e trilhos fugindo dos baixios. A população com a pulga atrás da orelha temendo a inundação que prometia ser muito forte. O bando de sapinhos ganhou a estrada, penetrou por trilhos no cerrado e foi visto nos Quatro Marcos, péssimo agouro. Quando menos esperava, alerta geral. A Escola promovia a reunião para a entrega de resultados finais. Mães com boletins dos filhos nas mãos eram solicitadas com urgência, o rio Preto vinha chegando como uma avalanche inundando tudo. As salas de aula se transformaram repentinamente em abrigo para as famílias. Verdadeiro mutirão se organizou quase por encanto. Carros, carroças, tratores, caminhões transportavam a todo vapor os pertences da população.
Impressionante; os moradores apesar da dramaticidade da situação, não perderam o ânimo nem o humor. Passaram a noite em vigília observando o nível da água, que a cada momento ameaçava mais; de vez em quando grande barulho provocado por paredes desmoronando. A pinga sob o pretexto de “rebater a friagem” corria solta. A expressão mais ouvida era: - o trem tá feio! As ruas ficaram como rios, podia-se navegar de barco para todo o lado como se a Vila houvesse se transformado na “Veneza do Sertão”. A molecada já com os lábios arroxeados de tanto ficar brincando na água, delirava com tanto espaço para nadar. A enchente, apesar de tudo, mais parecia um presente do céu. Até as novenas de Natal tiveram mais brilho; o encerramento com o pessoal reunido nos abrigos participou da ceia em clima de grande confraternização. Muitas casas ruíram, roças foram perdidas, muitos desabrigados; nada disso abateu o ânimo de ninguém. Só havia um temor no ar: que a estrada danificada pela chuvarada não permitisse a chegada do caminhão de bebida e o estoque se esgotar.
- O trem tá feio!
- Se isso acontecer, o trem fica feio!


Você sabia?

• A enchente que teve maior duração foi a de 1979, choveu quarenta e cinco dia sem parar. Deu grandes prejuízos em todo o Estado. A que atingiu o ponto mais alto embora com curta duração foi no Natal de 1989. A água sangrou na Dona Carlinda, atingiu um palmo no pé do poste, tomando a parte central. Segundo as informações, ela havia atingido tal nível em 1956, quando o local não existia nada além de vargens e pastagens nativas.
• No balanço das chuvas, o jornal MINAS GERAIS de 3 de janeiro de 1990 informou que a Vila havia sido inundada, deixando 60 desalojados conforme informação passada através de ofício da direção da Escola para a Defesa Civil.

Nenhum comentário:

Postar um comentário